quinta-feira, 26 de abril de 2007

Help! Solidão Multimídia

É domingo. São três horas da tarde. As formigas se amontoam sobre os restos de miojo do almoço. A casa vazia ecoa. Desde da primeira hora estou no meu confinamento. Nem os berros defecados pela descontrolada TV (e amante) do vizinho são capazes de impedir que a minha alma se evacue da carne!

E no momento em que o espírito começa a transcender à matéria, acaba por ser mais uma vez contido pela mente, que a extrapolados 365 dias insiste em projetar um mesmo filme sobre o pano interno das minhas pálpebras. Não suporto mais essa psicose! Preciso exorcizar de vez essas imagens. Nem mais os entorpecentes me fazem digerir o sono! Necessito com toda urgência demitir o segurança, instalar um interfone, arrancar três grades, pôr quatro escadas rolantes e distribuir por toda cidade as cópias das duas chaves que abrem as fechaduras da minha quitinete. Quero um qualquer que queira agora me escutar em Campina Grande!

Ainda como manda a dura rotina, ponho um rápido the end nesse drama de Sessão da Tarde: retiro os carnosos panos de projeção e edito um fade-in do meu quarto sobre as retinas. Todavia, diante dessa paisagem morta, pela primeira vez, em slow motion, traço uma panorâmica de 180° com as minhas sonolentas semigrandes angulares sem remelas, possivelmente à procura do último telespectador. Sabe aquela espécie de indivíduo que só se retira do cinema após ver a morte da palavra “Dolby Digital”? É exatamente um Homo Leão Jubarte desse de quem eu necessito. E, tal como os ridículos acasos dos roteiros hollywoodianos, eu me deparo com um deles sentado sobre a minha escrivaninha, bem quieto, entre as minhas “ficantes” Playboys!?

Confesso, contudo, que sua aparente falta de memória, associado ao seu "visu" da terceira idade e à total falta de intimidade entre nós, me desperta, logo de início, um certo clima de desconfiança. Preconceitos à parte, prefiro de antemão ainda não lhe chamar por seu famoso apelido “PC”, mas somente por seu nome estranho, acompanhado pelo primeiro tratável pronome que me vem à cabeça: Velho Pentium-100.

Inaugurada a minha comunicação com o distinto - como diria o meu metamorfizado presidente - “companheiro”, no imenso buraco negro em que estou, mais do que mero bobo-da-corte, cedo-lhe logo a maior de todas as patentes do meu reino medieval: a de Excelentíssimo Senhor Confidente. Terminadas as cerimônias de nomeação, despejo de imediato sobre o Word98 do pálido Pentium-100, todo o peso da mente que se me encrava na alma a carne e comprime os meus novos devaneios contra os velhos. Falo do curta-metragem incômodo! Falo da maior incógnita da física quântica! Falo da frase mais vulgarizada e prematuramente falada da atualidade! e que agora EU FALO de modo descompassado, frame por frame, batendo os meus inexperientes indicadores contra as teclas calejadas do novo confidente: EU TE AMO, Socorro!
Obs.: Este texto foi publicado na edição n.7 (Jun. de 2008) da Revista-Zine-Jornal de Audiovisual A MARGEM e também pela Revista CORSÁRIO no endereço: http://www.corsario.art.br/poemas/davidsobel/help.php

Um comentário:

Lebôs disse...

Esse texto também foi publicado pela Revista Corsário no endereço:
http://www.corsario.art.br/poemas/davidsobel/help.php