quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A Genética do Dom e a Dúvida da Fé

Para se ter um “dom divino”,
É preciso ter fé em Deus, nos ateus ou em si?
Para se ter o “dom” das artes,
É preciso ter fé nos artistas, nos consumistas ou em si?
Para se ter o “dom” das ciências,
É preciso ter fé nos cientistas, nos tradicionalistas ou em si?
Para se ter o “dom” da inteligência,
É preciso ter fé nos inteligentes, nos ignorantes ou em si?
Para se ter o “dom” da coragem,
É preciso ter fé nos corajosos, nos covardes ou em si?
Para se ter o “dom” da alegria,
É preciso ter fé nos alegres, nos infelizes ou em si?
Para se ter o “dom” da adoração,
É preciso ter fé nos ídolos, nos idólatras ou em si?
Para se ter o “dom” da vitória,
É preciso ter fé nos vitoriosos, nos derrotados ou em si?
Para se ter o “dom” do emprego,
É preciso ter fé nos empresários, nos desempregados ou em si?
Para se ter o “dom” da riqueza,
É preciso ter fé nos ricos, nos miseráveis ou em si?
Para se ter o “dom” da casa própria,
É preciso ter fé nos arrendatários, nos sem-teto ou em si?
Para se ter o “dom” do terreno próprio,
É preciso ter fé nos latifundiários, nos sem-terra ou em si?
Para se ter o “dom” das três refeições diárias,
É preciso ter fé nos bem-alimentados, nos esfomeados ou em si?
Para se ter o “dom” de criar,
É preciso ter fé em um Criador, nas criaturas ou em si?

(Escrito em 14.06.2003)

Sobre o colo de Mamãe...

- Ehhhhhh!!! IÁ!
- Hahahahahhahaha!! IÁ! Ha-ha! IÁ!
- Ehhhhhhhhh!!! Iá!
- ÁIhhh!
- Ui... Caiu... Eita... Ivison? Ui...

- EITA OLHA AQUELE MENINO DERRUBOU O OUTRO NA ESCADA! UI! UI!
- EITA O MENINO QUE CAIU TÁ SANGRANDO! VAMOS DIZER PARA TITIA!
- TITIA! TITIA!

... Paiêi de bincar. Com os óios bem gladão, desse tamanho, eu ôiei po dodói de Ivson, colhoquei minha mão na cabeça... o qui fiz? Se levantei do chão bem digavazinho com as unhas já dento da boca e andei um poquinho pa tás... Olhei pus ladus... Todo mundo no requeio apontava os dedos pa eu... En-ôlei as minhas mãos na farda e então escondi elas dento do shorti... Eu num sabia o que fazer cum tantos dedos... Então vi uma tampinha de guaraná perto das minhas botas do He-man... Peguei ela e fiquei apetando suas pontinhas conta a palma da mia mão... De ôio na tampinha amassando, colocava a língua pa fora da boca tentando esticar o mais longe que podia pus ladus... até eu então dissê algo pa todas as pessoas... não tia coiagem de óiar nus óios das pessoas que me oiavam... Foi sem queiê! Sem queiê! Sem queiê... Mas eu fui pa peto de Ivson e consegui oiar pus óios dele. Como ele choiava bem altão! Modia a língua e se coçava todo vendo Ivson choiá... Eu também tinha vontade de choiá, maich eu tenho vegôia que vejam eu choiando... E eu não choiêi... Eu pedi disculpa... disculpa um bocado de vez... Na última vez, eu gitei! Mas acho que ninguém escutou eu gitar...

Tia Madalena pegou Ivson nos baços... Ela caegava ele cum rapidez. Eu corri e tentei segui Titia e Ivson até a sala banca de cuidar de dodói... No meio do caminho Titia oiôu pa eu com uma cáia bem feiona e disse pa eu que ia contar tudo po pai Chicão... e também disse que eu meiêcia um castigu bem gande.

Paiêi... Me senti uma pessoa tão malvada... Fiquei com tanto medo... com medu da sua q meu padasto ia da em eu cum minha espada de binquedo, com medo do castigo de Deus... eu fiquei com medo dos meninos da segunda, da teceia e da quata-série que oiavam bem brabo pa eu. Dois gadões chamaiam eu de... “Fio da puta”, oto, goducho, pegou eu à foça nas costas e guitou no meu ouvido a paiava “covade?”... ele também disse que ia levar eu pa irmã Dulce, a diretora da escola... Paiecia que eles todos queiam o meu mal. Paia se livá do menino gordo rápidu, fuiei a mão dele com a mia tampinha da mão... ele então soltou os meus baços... empuêi ele e coí... Sou medáia de pata em corrida nus jogos internos e consegui se escondê de todo mundo lá no meu escondirijo sequeto...

Por tás da quada de espote... Peto da sala dos homes que limpavam a escola. Entle capins, fôias, pequenus gaius, lamas e jambos amassados... Num jardim abandonado... Eu sentei peto da vazia fazendinha de caiacóis... de cabeça baixa eu choiava cum a farda na boca pa não fazê baiúio... Escutava o som do apito da aula de educação física que vinha da quada... Em cima da láguima que caia no chão eu disenhei cum a tampinha um monte de coraçõezinho com flecha na aiêia... chupei quato chiquetes com figu-inhas de monstos... Eu chupei os chiquetes até se esquecê du gosto bom do morango que ele tinha... Até eles ficáiem bancos... Até a mia boca ficar duendo... Lembava o tempo todo da minha bincadeira com Ivson, da minha rasteia pur tás deile, da sua queda feia no chão, da sua cabeça batendo na ponta do chão da escada... lembava da camisa dele toda suja de vermelho... Rezava pa mamãe do céu mandar a Senhola ir logo me pegar no colégio... Desculpa Mamãe, foi sem queiê... sei que homemzinhos não choiam, maich dinovu a sinhola não foi me buiscá nu coleju e o meu pai do céu também já se esqueceu de eu.

Texto rápido para o violão improvisado do músico Giancarlo Galdino, 17.02.2006