quinta-feira, 26 de abril de 2007

Víbora...

Sonâmbulo... Espirro salgadinho... Sardinha... Azeitona... Amendoim... Amanheço... Sentado... Sobre o pesadelo do Rum Montilla... Kaiser...

Equilibro... Com as vértebras dos antebraços... Magros... Curtos... O corpo de cima sobre o de baixo... Encaixo... Os punhos no vazio das bochechas... Secas... E contra as cútis dos fêmures... Finco... Todo o peso sobre os cotovelos... Dormências...

Bocejo... Gozo lágrimas de merda e mijo... Contemplo... O som das cachoeiras... Respingos... Alívio... Arrepio... Inspiro... As flores dos azulejos... Sinto... A fragrância do Açude Velho... Suo... Suco de neurônio com sal e limão... Ardo... O colírio da luz sobre as pupilas dilatadas...

Olho contra o espelho... Mocidade... Gotículas de pasta seca sobre o reflexo da face... Papai... Sr. Mario... Sabão de côco... Fio dental jogado na pia... Leite de rosa... Pente de chifre de boi... Cueca atrás da porta... Mamãe... Dona Maria... Frascos reutilizados de xampu e condicionador... Identificação das toalhas com bordados feitos a mão... Saco da feira revestindo o lixeiro... Tablete de sabão amarelo pra lavar as mãos... Escova de unha... Pedra-sabão... Bucha... Toca...

Cuia... Balde de plástico... Banheiro número 611... Estrada do Brejo... Bairro da Linha do Tiro... Recife... Infância... Babá... Sexo recém-descabelado... Aos seis anos... Há indeterminadas primaveras... Desabrochado... Cabelos encaracolados castanhos... Brancos... Entopem o ralo... Érica... O rodo... Cristiane... A vassoura... Tempo... A pá... Vazio... O lixeiro... Nenhuma paixão remanescente...

Espalho... Os dedos pisam a poça da rachadura... Larga... Água gelada... Adentra o piso... Continua... Falha por todo os lados... Vira Avenida Floriano das formigas... Molho... Espalho... Molho... Engelho...

O sol de vidro ainda aceso da noitada... Uma víbora lá dentro presa... Realidade... A falta de papel higiênico... Um Ser... Lentamente... Ser cremado... Vivo... Derretendo... Derrotado de necessidades... Privada... As reticências... Os seus derradeiros suspiros... Entretenimento...

Fungado pelo instinto... Olho entre as pernas... Presente... Escarro as nicotinas do silêncio... Cuspo ontem sobre agora... Espreguiço os braços... Um último bocejo anal... Alcanço... O interruptor da luz... Levanto... Camb... ot... Ando até a mesa da janta... Pego... Os guardanapos coloridos... Limpo... A hemorróidas... Banho-me... Um copo de cerveja quente... Espumas... Descarga... Arroto... Sorrisal...


Dedicado a Augusto, Mario, Clarice e Carlos.

Help! Solidão Multimídia

É domingo. São três horas da tarde. As formigas se amontoam sobre os restos de miojo do almoço. A casa vazia ecoa. Desde da primeira hora estou no meu confinamento. Nem os berros defecados pela descontrolada TV (e amante) do vizinho são capazes de impedir que a minha alma se evacue da carne!

E no momento em que o espírito começa a transcender à matéria, acaba por ser mais uma vez contido pela mente, que a extrapolados 365 dias insiste em projetar um mesmo filme sobre o pano interno das minhas pálpebras. Não suporto mais essa psicose! Preciso exorcizar de vez essas imagens. Nem mais os entorpecentes me fazem digerir o sono! Necessito com toda urgência demitir o segurança, instalar um interfone, arrancar três grades, pôr quatro escadas rolantes e distribuir por toda cidade as cópias das duas chaves que abrem as fechaduras da minha quitinete. Quero um qualquer que queira agora me escutar em Campina Grande!

Ainda como manda a dura rotina, ponho um rápido the end nesse drama de Sessão da Tarde: retiro os carnosos panos de projeção e edito um fade-in do meu quarto sobre as retinas. Todavia, diante dessa paisagem morta, pela primeira vez, em slow motion, traço uma panorâmica de 180° com as minhas sonolentas semigrandes angulares sem remelas, possivelmente à procura do último telespectador. Sabe aquela espécie de indivíduo que só se retira do cinema após ver a morte da palavra “Dolby Digital”? É exatamente um Homo Leão Jubarte desse de quem eu necessito. E, tal como os ridículos acasos dos roteiros hollywoodianos, eu me deparo com um deles sentado sobre a minha escrivaninha, bem quieto, entre as minhas “ficantes” Playboys!?

Confesso, contudo, que sua aparente falta de memória, associado ao seu "visu" da terceira idade e à total falta de intimidade entre nós, me desperta, logo de início, um certo clima de desconfiança. Preconceitos à parte, prefiro de antemão ainda não lhe chamar por seu famoso apelido “PC”, mas somente por seu nome estranho, acompanhado pelo primeiro tratável pronome que me vem à cabeça: Velho Pentium-100.

Inaugurada a minha comunicação com o distinto - como diria o meu metamorfizado presidente - “companheiro”, no imenso buraco negro em que estou, mais do que mero bobo-da-corte, cedo-lhe logo a maior de todas as patentes do meu reino medieval: a de Excelentíssimo Senhor Confidente. Terminadas as cerimônias de nomeação, despejo de imediato sobre o Word98 do pálido Pentium-100, todo o peso da mente que se me encrava na alma a carne e comprime os meus novos devaneios contra os velhos. Falo do curta-metragem incômodo! Falo da maior incógnita da física quântica! Falo da frase mais vulgarizada e prematuramente falada da atualidade! e que agora EU FALO de modo descompassado, frame por frame, batendo os meus inexperientes indicadores contra as teclas calejadas do novo confidente: EU TE AMO, Socorro!
Obs.: Este texto foi publicado na edição n.7 (Jun. de 2008) da Revista-Zine-Jornal de Audiovisual A MARGEM e também pela Revista CORSÁRIO no endereço: http://www.corsario.art.br/poemas/davidsobel/help.php